Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de agosto, 2009

um mês de música

No sábado à noite, dia 29, assisti a Camerata Antiqua de Curitiba tocando obras sacras de Mozart e durante quase uma hora acreditei que a música sacra erudita é um modelo insuperável. Numa apresentação irretocável, coro, orquestra de câmara e instrumentistas convidados atestaram a beleza (alegre e reverente?) da Missa Breve KV 258 , composta por um Mozart de vinte anos. O Brasil imperial tinha um epígono mozartiano: o padre José Maurício Nunes Garcia, de quem a Camerata apresentou uma pequena antífona sacra composta - olha aí, ô Amadeus -, no vigor de sua adolescência, aos 16 anos. Se, assim como eu, você é um só professor-de-marré-de-si e não foi ao concerto da Sinfônica de Israel – ingressos a R$ 400 e tantos; se você, como este web-escriba, acha que o show de Aline Barros não vale o preço que estão cobrando – R$ 600 reais o camarote para 10 pessoas; se você é daqueles que acreditam que “boa romaria faz quem em sua casa fica em paz”, então tenho o programa quase ideal para você: o i

para entender o gospel no Brasil

O gospel pode ser considerado um dos fenômenos culturais mais significativos do início do século XXI. Nos últimos anos, o gospel deixou de caracterizar um estilo musical de origem norte-americana para agora constituir as novas atitudes e posturas evangélicas. Mais do que música, o gospel passou a ser um modo de produção. O cantor gospel, que alguns chamam de levita ou adorador, tem se tornado não apenas o intérprete musical da mensagem evangélica, mas também passou a ser considerado um multiplicador financeiro de objetos, acessórios, roupas, eventos. A canção gospel brasileira é multivariada: gêneros populares nacionais e estilos musicais globalizados dividem espaço nas rádios, gravadoras e lojas. Excetuando-se as canções de "Louvor & Adoração", o estilo consolidado no Brasil pelo Ministério Diante do Trono, o repertório gospel está em intensa interação com aqueles estilos de maior sucesso no repertório pop das mídias. Esse é o tema que procurei aprofundar na minha pesqu

inimigos públicos, amigos íntimos

Uma das amizades mais estáveis e duradouras é aquela celebrada entre o cinema e a história de criminosos. Não estou falando da interferência do crime organizado na produção de um filme, como o caso clássico e suspeito em que Frank Sinatra teria ganhado um papel relevante em A Um Passo da Eternidade (1953) com uma “forcinha” da máfia – o cineasta Francis Coppola fez uma referência nítida a esse episódio em O Poderoso Chefão . Como Roliúdi não faz nada que o público em geral não esteja sedento por ver, de alguma forma, então, a vida bandida suscita interesse por parte da platéia. Talvez por curiosidade, a mãe de todos os pecados, talvez por fome de vingança, por desejo de ver a bandidagem no xilindró ou, em muitos casos, por querer ver a autoridade policial levar um baile dos bandidos. Um dos primeiros filmes americanos, produzido em 1903 pelo inventor Thomas Edison, já tratava de assuntos policiais: O Grande Roubo do Trem . No entanto, foi a partir dos anos 30, quando os efeitos da

lições de um domingo esportivo

"Só sei que nada sei" é o socrático lema de todos os humildes pensadores. E também desculpa para entregar um trabalho mal-feito na faculdade. Mas uma hora a gente tem que aprender alguma coisa, que a vida não é essa pasmaceira grega de ficar pensando e filosofando e filosofando e pensando. Afinal, pensar dá fome e filosofia não enche barriga, a menos que você seja francês ou professor da USP, e olhe lá. Resta aos filhos deste solo abrir a mente e aprender com filósofos contemporâneos da fina estirpe de Bernardinho, Rubens Barrichello e André Lima, três seres agraciados pelo destino neste fim de semana esportivo que passou. Tudo bem, fina estirpe é um pouco demais para os dois últimos. Mas tende calma, ó leitor inclemente, dai-me a graça de vossa companhia nas próximas mal-traçadas. Na falta de homens de boa doutrina, fica o exemplo de tranquilidade e ternura de Bernardinho. Só se for outro Bernardo, você dirá. O Bernardinho que conhecemos é o treinador que “ganha no grito”, é

cem palavras: se eu tivesse amor

Se tivéssemos amor, não precisaríamos da moral. Sendo esse amor autêntico, ele torna supérfluo todo imperativo categórico, regras de respeito mútuo. André Comte-Sponville, Petit Traité des Grandes Vertus (Pequeno Tratado das Grandes Virtudes) Ora, ora, se isso não se assemelha aos arrazoados de Paulo em I Coríntios 13 ou à resposta de Cristo a quem lhe indagava sobre qual o maior mandamento da Lei: Ama ao Senhor Teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, com todo o entendimento. Este é o primeiro e maior de todos os mandamentos. O segundo é: Ama teu próximo como a ti mesmo. Ver o contexto no livro de Mateus 22:34 a 40 Cristo não estava inventando uma nova lei, mas somente resumindo e reforçando o que já tinha sido revelado: o que Ele disse está em Deuteronômio 6:5 e Levítico 19:18. Se a gente sai a dizer que o cristianismo é amor e a suprema Lei de Cristo é o amor, há quem insista em nos contrapor mostrando os lados mais desprezíveis da religião. Mas se é um filósofo que fal

globo e record: tudo a ver

“Por um mundo melhor: fora Globo e Record”. Este poderia ser um slogan das redes de televisão concorrentes. Entretanto, há pouco vestígio de vida inteligente tanto dentro quanto fora da órbita das duas emissoras que estão em litígio desde a fundação do tubo de imagem. O melhor da Globo é o canal Futura; o melhor da Record é atazanar a vida da Globo. A briga entre Globo e Record é antiga e começa em meados dos anos 1960. O histórico dessa batalha encarniçada tem picos de refrega e momentos de trégua, mas nunca deixou de existir. No entanto, elas não são inimigas porque são diferentes. Ao contrário, são irmãs gêmeas separadas no nascimento. Uma das maiores atrações da Record nos anos 60 era o modelo de festival de música popular. Dali saíram do anonimato para a glória, e da glória para o exílio, muitos dos reconhecidos compositores da canção nacional. A Record também mostrou a nova cara da Jovem Guarda, jovens artistas tidos como rebeldes na época, mas que hoje (e até naquele tempo) ser

volta ao mundo em cinco notas - II

A gente bem que tenta levar o mundo à sério, mas convenhamos, com esses personagens que surgem no diário do planeta essa é uma tarefa cada vez mais difícil: Olhos estrelados como ovos fritos, testa crispada, rosto ameaçador e uma ordem de intenções nada gastronômicas ao colega de senado Pedro Simon ("engula o que disse"). Sem dúvida, as caras e bocas colloridas estão de volta no melhor (ou pior) estilo "afasta de mim esse cale-se". Repare na expressão do homem: depois da invenção do Olhar 43, o ex-presidente e atual senador Fernando Collor inventou o Olhar 666. A Olimpíada de Pequim e o Mundial de Atletismo de Berlim não são uma rima. Nem a solução. Os dois eventos provam que raios caem no mesmo lugar, sim. Usain Bolt bateu o recorde mundial dos 100 metros rasos por duas vezes e a saltadora brasileira Fabiana Murer perdeu e culpou a vara também duas vezes. Mera coincidência não explica, puxa vida! Michael Schumacher adiou seu retorno às pistas da Fórmula 1 alegando

quem canta, entenda

Como algumas toadas de louvor de oito versos repetidos ad infinitum (ou "ad extasis"), assim têm se mostrado ao mundo certos modelos de igrejas surgidas na esteira do neopentecostalismo e em avançada expansão: como repetições de histórias de má-fé e engodo. Se o Ministério Público investiga, os líderes religiosos (e alguns fiéis) se dizem perseguidos pela concorrência; se outros cristãos enxergam falhas vergonhosas, os seguidores dos "bispos" dizem que só quem pode julgar é Deus. Não vou entrar no mérito da "perseguição" - que só existe no plano da concorrência midiática. O que me chama a atenção é essa pressa em repudiar todo julgamento alheio. Quando uma crítica é dirigida a uma organização religiosa, não se está julgando senão aquilo que já está fartamente notado, investigado e noticiado. Fiados numa equivocada interpretação do famoso "Não julgueis, para que não sejais julgados", os defensores leigos dos bispos neopentecostais não admitem crít

mozart inédito

Mozart: o cometa mais fulgurante que atravessou o universo da música: foi visto e ouvido por pouco tempo, atribuíram-lhe sinais divinos de astro celeste (e também lhe apontaram sinais diabólicos) e, volta e meia, retorna musicalmente para encantar as novas gerações. Um cometa, sem dúvida. Recentemente, a Fundanção Mozarteum de Salzburgo divulgou duas peças para piano, até então inéditas, que descobriram ser de autoria de Mozart. Compostas quando o geniozinho tinha só oito anos. Claro, elas não acrescentam nada de novo ao que já é fartamente conhecido. Como disse o crítico musical João Luiz Sampaio, "o que [as peças] fazem é apenas se somar a um quadro fascinante no qual o compositor segue desafiando nossa compreensão do gênio musical". Embora sua carreira de moleque genial seja posta em dúvida - era ele mesmo que compunha aquelas peças na infância ou o autor era na verdade o seu pai músico, Leopold? -, a liberdade de criação de Mozart o isola de seus contemporâneos. Sim, to

"Deus é amor" ou "Deus, meu amor"?

Na interpretação contemporânea do cristianismo, a concepção da majestade de Deus tem perdido espaço para a noção de um Deus mais próximo da criatura, um Deus menos rei e mais companheiro de viagem. Em oposição ao antigo conceito da divindade inalcançável, cujo aspecto mais notório foi o monumentalismo das igrejas medievais e o cantochão em latim, passou-se a outra noção de Deus, em que o aspecto central não se nota no projeto arquitetônico das igrejas, mas na forma de adoração que enfatiza uma extremada intimidade. Essa intimidade está baseada na compreensão do cristão moderno sobre o “amor” divino e humano. Podemos dizer que a interpretação sobre esse “amor” tem sido fundamentada menos na doutrina bíblica e no relacionamento Deus-criatura e mais no romantismo idealizado e no relacionamento homem-mulher. A Bíblia abre espaço para a representação do amor de Cristo pela igreja por meio da linguagem simbólica do romance: casamento, Noivo e noiva, noiva ataviada. Como forma de tratamento d

o evangelho segundo o gospel

No começo deste ano, a Revista do Conservatório da UFPel (RS), publicou meu artigo "O Evangelho Segundo o Gospel: mídia, música pop e neopentecostalismo" . Nesse trabalho, constam as linhas principais da minha pesquisa de mestrado sobre a música gospel no Brasil: cultura, canção pop e pentecostalismo. Com subcapítulos como, mídia e o gospel no Brasil, o gospel e a sacralização do pop, abordo o fenômeno da música da religiosidade cristã contemporânea, observando principalmente a relação da indústria fonográfica gospel com as estratégias e operações do mercado fonográfico da assim chamada mídia secular. A seguir, algumas considerações extraídas do texto (ao final, indico novamente o link para o artigo completo): "A música gospel tem sido um destacado vetor de divulgação da renovação religiosa promovida pelo neopentecostalismo. No estudo da música cristã contemporânea no Brasil, este artigo analisa a integração e a similaridade da canção gospel em relação aos modelos da can